terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O Futuro e o Enxofre

A flor por entre as rachaduras do cimento desabrocha esplendorosa, por entre a terra seca finca as raízes que serão nutridas pela água que se infiltrará através das precipitações e se esforça para erguer seu corpo e conseguir a tão incrível luz que a manterá viva e forte. Uma sobrevivente em meio ao caos e a poluição, uma guerreira silenciosa e sábia, um lembrete da própria terra de que ela passará por cima de nós e de nossa história para se manter soberana. Apenas um lembrete que cresce vagarosamente, com a paciência digna de um mestre que viveu muitos anos praticando a arte de seguir o tempo que for necessário para que tudo aconteça. 
O apocalipse desordenado é interrompido pela mais bela sinfonia da vida, quase como se tudo ao redor fosse parado ou tivesse apenas seu andar retardado por aquele sopro de esperança divino. A luz do dia se fixa naquele pequeno acontecimento; à noite, o espetáculo fica por conta da sensação de cascatas de faíscas, como em comemorações especiais em celebração a tudo que é mais belo. Ao entardecer, o sol poente lança seus últimos raios em saudação a nova vida que acaba de nascer. 
Um pé põe fim a toda esperança. Apenas um pé foi capaz de estraçalhar o mais belo lembrete de nossa criação. Um pé calçando um coturno surrado e imundo foi o responsável pelo retorno da sinfonia da destruição, dos violinos desafinados, dos trompetes sem fôlego, das flautas insanas e do maestro usando colônia de enxofre. Apenas um pé governado pela insensatez, um pé mal cuidado e emporcalhado. Apenas um pé despedaçou a última pétala de esperança por nossas almas. Apenas um pé, apenas um corpo, apenas um maltrapilho a serviço de criaturas obscuras em troca de uma soberania atribuída apenas ao maestro de tudo isso. Apenas nosso destino. 

P.S.: Caminhemos de cabeça erguida, assim não veremos em que estamos pisando.
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segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Pandora e o Receptáculo: Um Rápido e Triste Fim

Pandora estava com a carta em mãos, paralisada eternamente naquele pesadelo. A lágrima escorreu por sua face petrificada e gotejou no chão. A implacável realidade, a verdadeira Medusa, finalmente a encarou. Estava só, vítima de seus próprios atos egoístas e vingativos, de sua língua bífida e de seu corpo apodrecido. A batalha para conquistar aquele que seria sua alma gêmea terminou em tragédia: a alma agora estava destroçada, esquartejada, esmigalhada, remontada e em nada lembrava aquela buscada inicialmente, tanto que seu receptáculo, outrora esguio e gracioso, estava macilento, aterrorizante, carrancudo e indesejável até mesmo pelos abutres! 
Aquela brava guerreira, forte em aparência e na escolha de palavras, cedeu, ajoelhou-se em prantos em frente ao enorme espelho de seu quarto. Não parava de questionar o por quê dessa derrota que, somente para ela, parecia tão repentina. Levantou-se, cambaleou até a robusta cômoda negra e pegou sua adaga de prata. Estava decidida: aquela alma antes tão desejada deveria ser destruída de uma vez por todas! 
Ao abrir a porta para cessar de vez os murros dados do lado de fora, a alma se viu apunhalada novamente em seu centro. A dor era tão intensa que ele urrou, lágrimas correram de seus olhos e seus joelhos desabaram. Pandora então se preparou para desferir mais um golpe quando foi surpreendida pelas mãos de sua vítima agarrando as suas, forçando-a a derrubar a adaga. Mesmo com a certeza de que estaria morto em poucos segundos, o agonizante macilento pegou a arma do chão e desferiu um golpe certeiro no coração de sua caçadora. Estava tudo terminado. Seus corpos jaziam juntos no escarlate hall de entrada. 
Uma história que começou tão bela e encantadora terminou como um massacre. Eles acreditavam que deveriam ficar juntos e assim foi feito. Não da maneira desejada, mas estavam agora eternamente unidos.


P.S.: Pandora, despertaste o caos no mundo novamente! Aliás, em dois pequenos mundos.
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quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Ciclos


O ciclo de amor e ódio, paraíso e inferno se mostra como em uma montanha russa sem hora para acabar. As amarras rompidas a força formam cachoeiras escarlates que desembocam em um oceano negro de amargor que, infelizmente, estás a se afogar. Tentas nadar para a praia mais próxima, mas de nada adianta se segues a maré pecaminosa que o conduz a alto mar. O espelho negro das águas reflete o oposto de tudo aquilo que sentes apenas para atraí-lo a uma armadilha mortal, tal qual as sereias fazem ao cantar para os marinheiros desavisados e descrentes. 
As vozes dos invocados das trevas o tentam, dizem com astúcia o que deves fazer, só não lhe dizem suas reais intenções. Vossas costas possuem adagas negras fincadas. Estas lhe sugam o resto de razão que outrora possuías aos montes. Sois agora como um boneco de pano jogado ao mar, encharcado, carregado pelas mãos fortes do oceano, servindo ao bel-prazer de toda espécie de criatura. Em pouco tempo, serás apenas um farrapo carregado pelas ondas até uma praia distante, para finalmente ser esquecido por todos aqueles que destruíram-lhe os sonhos, que desviaram-no do caminho para a felicidade e superação de sua própria escuridão, e serás lembrado eternamente por aqueles que tentaram remendar os rasgos, mas não pela beleza que um dia esbanjastes, mas pelo monstro que deixastes emergir em meio ao desespero.
A partir daqui serás apenas uma página virada no grande livro da vida. Uma página que começou com a esperança de que tudo seria diferente, mas no meio do caminho se tornou ilegível, desagradável e por fim encerrou-se de modo grosseiro, deixando o arrependimento por ter começado a lê-la como certeza irrevogável. Adeus, página chafurdada na imundície. Há muito já deveria ter sido virada. 

P.S: O ciclo encerra-se. Ao menos, é o que se espera. 
P.S.²: A falta de rancor e mágoa tornam-me um preguiçoso sem criatividade. 
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sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Final (Ou O Novo Gênesis)

Os últimos humanos realmente vivos lutam há mais de um ano contra aqueles que se levantaram das próprias tumbas. A comida se tornou rara, os lugares tranquilos para se produzir o que comer também, uma vez que em toda parte podia se encontrar um desses que se recusaram a morrer. Cidades enormes encontram-se destruídas. A vida selvagem foi completamente afetada pela migração dessas criaturas para as florestas em busca de comida. Um cenário previsível apenas em histórias em quadrinhos, séries e filmes sobre zumbis.
Mas o mais extraordinário e aterrador ainda estava por vir. Ao entardecer, um tremor violento rasgou as ruas daquela que já foi a maior cidade do mundo. Desse enorme rombo, uma figura aterradora se ergueu. Suas vestes eram negras e esvoaçantes, seu rosto coberto por um capuz, enormes asas de penas escuras como a noite surgiam de seus costas e em suas mãos pálidas e esqueléticas, uma gadanha cujo cabo era feito de uma madeira escura, com aspecto de algum galho recém-retirado de alguma árvore, e com lâmina brilhante e aparentando ser bem afiada. Todos que se encontravam naquela rua, vivos ou não, pararam para admirar tal entidade. Todos demonstravam medo em seus rostos. Todos ali conheciam aquela figura maligna e se espantaram ao vê-la emergir das profundezas. Logo, os vivos estariam ainda mais surpresos.
A criatura abaixou o capuz e revelou sua feminina, branca e magra face. Ao contrário do que muitos até então pensavam, a verdadeira face da morte não era horrível ou assustadora; era como de uma mulher bonita e muito magra, de cabelos negros e lisos, mas com o olhar firme e superior, sabendo de sua posição para a manutenção do universo. Ela então estendeu sua mão esquerda e, com um gesto simples de quem pede para alguém se aproximar, todos os mortos voltaram para seu sono eterno. Suas asas se abriram e ela desapareceu em um instante, deixando os vivos aliviados e confusos. O que realmente aconteceu? A morte perdeu o controle sobre as almas? Ou quis apenas que os humanos recebessem uma lição? A resposta nunca foi encontrada. 
A humanidade se refez, o mundo começava a se reerguer mas, dessa vez, com receio do que poderia vir a acontecer se as coisas chegassem ao nível que tinham chegado antes daquele apocalipse. Todos deixaram de apenas temer a morte, começaram a respeitá-la e a pedir para que ela não deixasse esse mundo novamente. A paz finalmente pôde reinar sobre os humanos. Era um final feliz para quem já provou inúmeras vezes que não merecia; era o aviso final.

P.S.: Não se deve apenas temer e evitar aquilo que é a nossa única certeza, pode ser que um dia ela não se faça presente e nos mostre da maneira mais difícil qual a sua verdadeira função.
P.S.²: Fim da saga dos mortos-vivos. Fim do mainstream.
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sábado, 7 de julho de 2012

Última Parada

E o ônibus se aproxima de sua última parada antes de chegar ao seu destino final. Todos os passageiros começam a acordar, coçar os olhos e enfileirar-se no estreito corredor para finalmente irem ao banheiro e esticar um pouco as pernas após algumas horas de viagem pela madrugada. Mas algo não estava normal: uma pequena multidão se aglomerava ao redor de um ônibus mal estacionado em sua vaga. Uma mulher gritava desesperadamente e era amparada por funcionários do famoso posto à beira da estrada. E logo o motivo ficou visível a todos daquele recém-chegado ônibus: havia um corpo estirado entre o veículo mal estacionado e a sarjeta de sua respectiva vaga.
Ao descer, a maioria dos passageiros se reuniu à curiosa, e cada vez maior aglomeração para ver o desfigurado defunto. Mas a fúnebre alegria durou pouco, pois logo as equipes de resgate e os policiais chegaram para averiguar o ocorrido e, obviamente, dispersar os urubus de cima da carniça fresca (como dito por um dos socorristas). Após alguns instantes, a maioria dos curiosos foi dispersada, o corpo foi coberto e os policiais começaram a coletar informações com as testemunhas uma a uma. 
Os passageiros do até pouco tempo ônibus recém-chegado começaram a reembarcar normalmente após os costumeiros vinte minutos de parada quando uma senhora, lá do final da fila, começou a gemer de medo e apontar em direção ao corpo coberto. Todos pararam e levaram as mãos à boca ao vislumbrarem a bíblica cena do corpo que retorna do mundo dos mortos. Por alguns instantes acreditaram se tratar de um milagre, mas logo perceberam que era a própria visão do apocalipse: o corpo ressurreto grunhiu ferozmente e avançou em direção a uma das testemunhas, mordendo-lhe e arrancando-lhe um grande pedaço de seu rosto! Os policiais então o agarraram e o forçaram a soltar a testemunha, mas ele não pode ser contido e começou a avançar em direção a uma jovem que estava próxima ao banheiro. Ambos, corpo e jovem, correram para dentro do banheiro e para fora da visão dos embasbacados passageiros.
A garota, em um estranho reflexo de seu pavor, correu com o corpo virado para aquela assustadora criatura e, ao topar com um balde, caiu sentada no frio e molhado piso. Antes mesmo que pudesse descobrir do que o piso estava molhado, o ensanguentado e enfurecido morto vivo lançou-se para cima da jovem, com suas mãos sempre à frente para garantir que sua presa não fuja. Ela tentou impedir o avanço dos destroçados dentes com força total, mesmo sabendo que não seria suficiente. Os dentes estavam conseguindo chegar cada vez mais perto de seu suave pescoço. Ela fechou os olhos para sua última prece. E um estrondo se fez ouvir naquele ambiente imundo. E o corpo estava novamente sem vida. E uma voz arrogante se fez ouvir:
- Então é assim que isso vai começar? Um atropelado correndo atrás de uma garotinha? Você ai de cima, e você ai de baixo: esperava algo melhor vindo de vocês para um apocalipse! 
Quando finalmente abriu os olhos e removeu o gélido cadáver de cima de seu belo corpo, a jovem não conseguiu localizar seu salvador, só alguns curiosos se aglomerando cada vez mais na porta do banheiro para tentar entender a situação. Mas todos ali, sem sequer trocar uma palavra, sentem que aquilo era só o começo de algo que os colocaria em grande perigo.

P.S.: E assim o mundo caminha em direção ao juízo final! Os mortos levantam de suas tumbas e julgam quem deve ou não permanecer realmente vivo, ou seja, nenhum de nós! Nos vemos na Igreja dos Mortos-Vivos para uma última oração.
P.S.²: Um assunto tão desgastado que rende inúmeras histórias. Me rendo à ressurreição dos putrefatos.
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quarta-feira, 6 de junho de 2012

A Igreja dos Mortos-Vivos

"Pai nosso que estais nos céus
A primeira frase sussurrada ao ajoelhar-se no genuflexório não poderia ser outra, não poderia ser murmurada sem ser ajoelhado, não poderia ser feita com paz no coração. Não naquele momento.
"Santificado seja o vosso nome"
Ao fundo, passos. Lentos passos rumo ao altar, em direção daquele que perturbava o martírio de Nosso Senhor.
"Venha a nós o vosso reino"
A quem pertence aquele caminhar? Seria a um deles? Não! Apesar de lentos, são passos firmes, de quem realmente sabe para onde vai! Talvez seja mais um fiel.
"Seja feita a vossa vontade"
As mãos estão agora mais unidas do que nunca. O suor escorre por entre os dedos trêmulos de quem não tem certeza se, dali para frente, tudo estará bem.
"Assim na terra como no céu"
Os atitos dos gaviões que voam nas alturas se fazem ecoar pela cúpula quase como se eles estivessem dentro daquele templo.
"O pão nosso de cada dia nos dai hoje, perdoai as nossas ofensas"
Esses malditos passos estão cada vez mais próximos e mesmo assim demoram a chegar!
"Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido"
Talvez seja aquele vizinho chato vindo pedir perdão pelo palavreado abusivo de quando tudo isso começou.
"E não nos deixeis cair em tentação"
E quase no final da mais sagrada das orações, a mente se desvia para as lembranças da noite em que a mulher do vizinho serviu de consolo para a perda da própria esposa.
"Mas livrai-nos do mal"
Os passos pararam. O som da inspiração indicava uma proximidade assustadora.
"Amém!"

O estampido do revólver ecoou por toda a igreja. O sangue projetou-se de uma perfuração no centro da testa direto para o branco que envolve o altar. O corpo largou-se sobre o apoio do genuflexório, como um anjo se debruça sobre o túmulo.
O último pedido de um desesperado foi realizado. Estava livre daquele mundo na qual a força não designa aquele que sobrevive. O mundo se tornou um lugar cujos mortos erguem-se para saciar o desejo infinito de ingerir partes daqueles que foram de alguma importância em suas vidas.
Mais uma vez o estampido afugentou os pássaros que descansavam no coro. A arma estava no chão. Ao seu lado, um corpo de meia idade a reforçar ainda mais o vermelho do tapete. Ao fundo, dezenas correm em direção ao tão esperado banquete.

P.S.: E nesse dia, a excruciante dor de ter generosos pedaços da carne mastigados foi evitada graças a alguém que atendeu aos pedidos contidos na prece. Pode-se dizer que foi obra de um controverso anjo.
P.S.²: O sacrifício realizado nunca será em vão.
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terça-feira, 29 de maio de 2012

A Chave dos Três Destinos


Uma chave e três fechaduras. A chave é compatível com todas as fechaduras. Porém, se uma for aberta, as outras duas se fecharão. Há placas com enigmas e pistas sobre o que está atrás de cada porta. A decisão sobre o que libertar é de única e exclusiva responsabilidade do portador da chave. O tempo está passando, mas isso não quer dizer que a chance escapará e nunca mais retornará. Aliás, a chance só escapará se o portador decidir se desfazer da chave ou, de alguma forma, tentar encontrar alguém para assumir seu lugar, o que é praticamente impossível, pois a chave costuma escolher o próximo portador. 
Essas são as instruções para que o templo seja aberto! São três caminhos, uma escolha e as consequências variam da glorificação à destruição daquilo que um dia foi uma construção repleta de vistantes que, apesar de não se interessarem pela estrutura física, queriam absorver todo seu conhecimento e compartilhar o próprio. Agora resta apenas a carcaça vazia e egoísta em manter todas as informações trancadas em um pequeno e sofrido receptáculo.
Vá! Abra o templo! Não importa se decidirá fazer isso hoje ou daqui seis meses, apenas faça! Não deixe que tamanha estrutura seja destruída pelas areias do tempo e da insanidade! É o último portador, aquele que selará o destino de tudo! Apenas faça o que tem de ser feito!


P.S.: Instruções gerais para cumprimento de destino alheio. Talvez seja melhor apenas atear fogo à elas e deixar que o destino decida o pior caminho possível, mas ainda há alguma esperança, mesmo que bem pequena, de que tudo ficará bem.
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quarta-feira, 25 de abril de 2012

Madrugada

Quarto escuro, cama dura, insônia e desespero. Aquela noite só poderia ser descrita dessa forma. Olhar para o teto escuro e pensar no que seria feito do futuro era tudo que restava para o abatido rapaz ( E ele estava realmente abatido: seu roliço e rosado corpo fora transformado em um esquelético e acinzentado pedaço de ser humano!). Finalmente ele conseguiu fechar os olhos e começou a levemente cochilar.
Na escuridão da madrugada, um estalo ensurdecedor fez com que o jovem literalmente pulasse da cama e se colocasse prontamente em pé a seu lado. Ao olhar para frente, deparou-se com um par vermelho de olhos encarando-o fixamente e ficou estático de pavor! Não conseguia se mover, por mais que quisesse. E lá estavam aqueles dois círculos flamejantes fixos em direção a seus olhos; um olhar tão profundo e apavorante que parecia apoderar-se de seu corpo.
As horas passaram e nenhum dos dois se movimentava: nem o dono dos olhos, nem o rapazote. Com isso, o medo foi lentamente deixando seu corpo mais controlável e, com isso, resolveu se aproximar e verificar se aqueles olhos realmente possuíam um dono. Passo a passo ele se colocou mais próximo do que tanto o assustava, até que esbarrou em uma superfície plana e fria. E lá estavam os olhos fixos nos seus novamente. Mas, dessa vez, a luminosidade vermelha permitiu que ele descobrisse quem estava a encará-lo.
Boca entreaberta, uma lágrima desesperada sutilmente rolou por sua face: o dono daqueles olhos era ele mesmo! A superfície fria era um grande espelho que deveria ter sido levado para a sala durante a tarde. Ele se ajoelhou, levou as mãos à cabeça e, com um forte grito, acordou em sua cama com o celular avisando que já era um novo dia. E o espelho continuava em seu quarto.



P.S.: Sonhos realmente podem dizer muito sobre determinadas situações, mesmo não sendo da maneira mais direta possível.
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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Carta de um Cadáver

O trecho a seguir foi retirado de uma carta encontrada nas mãos de um suposto suicida. O começo da carta estava danificado demais e tornou-se ilegível. 

"(...)após todos esses anos, todas essas decepções, desventuras, desesperanças e punhais ardentes em minhas costas, eis que me isolo do mundo. Ah! Esse tão cruel mundo moderno, com sua tecnologia capaz de unir pessoas distantes e separar as próximas, unir dois corações em uma única parte e depois picotá-lo como se fosse um mero pedaço de papel nas mãos de uma criança e capaz, também, de criar pessoas cada vez mais frias, obscuras e tristes, incapazes de domar os próprios sentimentos. 
Talvez agora, alguns meses isolado, eu perceba o quão maravilhoso era esse mundo (e o quão perverso era também). As noites mal dormidas, a incrível falta de momentos sóbrios, as intrigas, as promiscuidades que não envolviam a conexão carnal em si, mas eram dignas de contos eróticos e bizarros, a filosofia embriagada de pessoas com a mente vazia da utilidade buscada pelas grandes empresas e lotadas das mais diversas formas de cultura inútil, todas essas características me despertaram um sentimento de nostalgia. 
Hoje sinto nostalgia, mas não aquela que parece dizer 'como foi bom esse tempo! Mas agora é hora de seguir em frente!' e sim aquela que me diz 'Esses foram momentos de sua vida. Olhe para trás enquanto pode, pois serão suas últimas lembranças!'. O futuro se mostra a mim como uma grande muralha negra, que não me permite enxergar sequer um pequeno filete de esperança. 
Minha cabeça está cada vez mais como uma grande orgia entre todos os pensamentos, onde um mero observador consegue ver o que se passa, mas não entende os detalhes por estarem confusos em meio a tantos braços, pernas, corpos, cabeças e ruídos. Sinto todas as noites como se fossem a última. Talvez essa realmente seja! Mas vou passá-la como tenho passado todas as outras, repousando a cabeça em meu surrado travesseiro. "

P.S.: E ele não mais se levantou. E, apesar da pouca idade, seu cadáver aparentava ser de alguém décadas mais velho. Talvez a vida tenha lhe sugado os últimos resquícios de juventude fazendo-o entendê-la antes da hora.
P.S.²: Voltando a escrever após um pequeno hiato. Dedos e mente enferrujados. Prometo melhoras.
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