quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Espessa Janela

Enjaulado, preso em um pequeno cubo composto por barras de ferro grossas e esburacadas. Há apenas uma lâmpada que desce de uma das barras que compõem o "teto" dessa jaula, que está suspensa na escuridão.
O desespero de estar preso em uma pequena jaula em meio à escuridão é indescritível, talvez só não seja pior do que perceber que a cela está, de alguma forma, encolhendo! As barras começaram a ranger e a se movimentar vagarosamente em direção ao centro da jaula. Os gritos de desespero pareciam abafados: talvez a sala fosse preparada acusticamente para que os sons ficassem ali dentro, ou o desespero tampou-lhe os ouvidos.
Um leve cheiro de gás, uma fagulha e as barras estavam em chamas! Os orifícios que predominavam na jaula eram para acender o fogo! Apenas o chão não estava completamente em chamas. Mais desespero e logo após, conformidade... não havia escapatória! O cruel destino estava se aproximando ardentemente.
As luzes da enorme sala se acenderam. No centro, a jaula parecia uma grelha que acabara de deixar passar do ponto a carne do macabro churrasco. Nas paredes, janelas com um espesso vidro, onde podiam ser vistas pessoas passando indiferentes ao ocorrido, como se não pudessem ver aquele horror, mesmo que escancarado em sua frente.

P.S.: "Interessante essa filmagem sendo exibida nessa parede! Que rapaz bonito e alegre esse das imagens! Mas parece que há uma luz ao fundo... parece fogo! É, deve ser apenas algum defeito dessa tela. Ela é muito grossa para esse tipo de projeção."
P.S.²: Grite quão alto conseguir! Ponha seus pulmões no mundo, polua-os com a toxidade da atmosfera! Torne sua voz tão estridente que quebre todas as taças de cristal! Mas tome cuidado: volume e estridência não garantem que será ouvido!
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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O Último Suspiro

O mundo começa a se ver mergulhado em uma estranha epidemia de uma desconhecida e lentamente mortal doença, cujos principais sintomas são fadiga e leve grau de cegueira* (com visão embaçada, semelhante à miopia) no começo e extrema fraqueza e visão bastante comprometida em seu estágio final.
A doença começou em uma pequena cidade do interior e se espalhou pelo país, gerando um alerta global que conseguiu conter a enfermidade até certo momento, mas alguns casos isolados começaram a aparecer em outros países.
O primeiro infectado, um rapaz em torno de 25 anos de idade, agora está no estágio terminal da doença e se encontra no isolamento do principal hospital daquela pacata cidade. Além da extrema fraqueza, a tristeza o acomete e só faz com que sua hora final chegue mais rápido. Mas sua tristeza não é oriunda da morte iminente, e sim do então inevitável desfecho de sua vida, sem poder sequer ver uma pessoa em especial: aquela na qual trocou correspondências por vários anos e que, devido aos desencontros da vida, não pode conhecer pessoalmente, quanto mais realizar o sonho de tocar seus lábios no dela.
No começo do que certamente seria sua última semana, o rapaz acordou com um estranho vulto à sua frente, que logo imaginou ser um dos médicos, apesar de não ser possível a percepção das enormes roupas para evitar o contágio. O vulto se aproximou, abaixou até próximo à sua orelha e com a mais tênue e, para ele, deliciosa voz exclamou um emocionado "finalmente estou aqui a seu lado!". As lágrimas foram inevitáveis e seguidas de um caloroso abraço e, finalmente, o primeiro beijo de duas almas que deveriam ficar juntas até o final de suas vidas. E assim foi. Ao término daquele tão esperado beijo, a vida daquele rapaz se encerrou.
Ao contrário do que se imagina, a amada não desatou a chorar de dor pela perda. Apenas sentou-se ao lado daquele que nunca desistiu, segurou firme em sua mão e com um satisfatório sorriso sussurrou algo como "Após tanta luta, finalmente ficaremos juntos para sempre".


P.S.: Vida injusta e desencontrada que nos prepara para uma eternidade tão certa e perfeita.
P.S.²: Pode demorar o tempo que for: mas tudo isso só tende a crescer e a amadurecer cada vez mais.
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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O Deus do Novo Mundo

Bolas de fogo caem do sanguinolento céu, arrasando grandes cidades como se fossem pequenos e vulneráveis formigueiros! Bestas aladas sobrevoam o pouco que restou, caçando sua refeição e combustível para as chamas lançadas por suas bocarras fétidas e repletas de presas afiadas: humanos!
O caos dominou o mundo após o anúncio de que um jovem de peculiares olhos possuía incríveis poderes dignos de um deus! Ele era capaz de criar vida apenas com sua imaginação e uso da energia vital predominante  na atmosfera! Extraordinário poder logo atraiu o interesse dos governantes e o temor dos meros ignorantes cidadãos, que passaram a hostilizá-lo e denominá-lo como aquele que traria o apocalipse ao nosso mundo.
O confiante rapaz, ciente das consequências de tamanho abalo perante sua onipotência, decidiu não se entregar aos governantes e muito menos aos revoltosos cidadãos ao redor do mundo: decidiu isolar-se em um típico e pacato campo, cuja localização não é conhecida. Viveu lá durante alguns poucos anos, aprimorando e descobrindo novas habilidades e ligações entre elas e seus acinzentados olhos, até que o mundo resolveu que era hora de eliminá-lo!
No decorrer desses anos, os amedrontados governantes se uniram e criaram um único exército para impedir o tão temido e, segundo líderes de todas as crenças e religiões, inevitável fim dos tempos! E esse esforço para aliviar a tensão geral e dar sensação de alívio chamado Exército da Nova Terra descobriu a localização e atacou a morada do jovem no amanhecer daquele quente domingo.
Ao redor do globo, as pessoas acompanhavam , vidradas em seus televisores, a operação que as livraria do terror iminente. Ao exibirem as primeiras imagens da humilde choupana do jovem com poderes olímpicos*, as emissoras foram surpreendidas com perda de sinal e exibição de uma tela escura. O planeta ficou aflito e o caos foi geral. Mal sabiam as pessoas que tudo terminaria em um banho de sangue.
Algumas horas após a queda da transmissão televisiva, o chão se abriu na praia da maior capital do globo, e dele emergiu uma enorme parede de pedra. Logo o céu se tornou escarlate e dele caiu a primeira esfera flamejante. Por trás da monumental parede recém-erguida, uma nuvem de bestas aladas decolou rumo à cidade. No topo daquele enorme bloco de pedra, surgiu a sombra de um homem trajando uma antiga armadura, remetendo aos poderosos samurais, e segurando um cajado com grossas argolas penduradas na sua extremidade em forma de meia-lua. O mundo aprenderá com a dor da perda a finalmente viver em paz.

*Comparados aos poderes dos deuses que habitavam o Monte Olimpo.

P.S.: O homem deseja eliminar aquilo que teme, mesmo que aquilo não demonstre vontade ou necessidade de causar temor ao homem.
P.S.²: Personagem, poderes e ideologia claramente inspirados nos personagens Nagato (e seu pseudônimo Pain) e Rikudou Sennin (Eremita dos Seis Caminhos), do mangá Naruto, cuja autoria é de Masashi Kishimoto e de direitos pertencentes à Shonen Jump. Apenas uma postagem ficcional completamente inspirada naquilo que o autor tem acompanhado durante os anos.
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segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O Âmago do Fracasso

A criatividade deixa minha mente, escorre pelas minhas pálidas mãos e se evade ralo abaixo. A dor, e a impossibilidade de desabafá-la em meios outrora utilizados para tal, me sufoca, me aperta o pescoço como um assassino que silenciosamente invade um quarto em busca de sua vítima (propositadamente ou em decorrência de um infeliz encontro durante um furto).
Meus olhos já não possuem mais vitalidade e carisma, apenas uma camada esbranquiçada de lembranças agradáveis utilizadas como amenas cortinas que disfarçam a feiura de uma janela que já sofreu as ações do tempo.
O corpo está deformado em decorrência do desespero por um bem-estar temporário, que fora devorado aos montes em troca de poucos momentos de tranquilidade torpe. Deformada está, também, a capacidade de raciocínio lógico, tornado em pequenos pedaços de realidade e distorcidos blocos de fantasia e melancolia.
Conforme o tempo passa, mais certeza há de que tudo serviu apenas para transformar um homem em uma criança despedaçada, acuada em um canto do quarto e vociferando absurdos para que ninguém consiga se aproximar de sua enorme e sangrenta ferida. Mesmo assim, a alma infantil ainda consegue ver um pequeno raio de esperança no horizonte sombrio da vida.

P.S.: O desesperador motivo pela qual uma pessoa pode sumir da vida de várias outras é o mesmo que fará com que o ciclo de angústia jamais se extingua. 
P.S.²: Talvez eu me arrependa de postar algo tão íntimo. Mas, como sempre, talvez a mensagem não seja tão facilmente decifrada. A sorte está lançada.
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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

As Lágrimas De Deus

    O polêmico magnata Antoinne de Saritré fora chamado a uma estação de rádio para uma entrevista tão incômoda quanto sua língua ao tratar de assuntos como política e religião - ambos temas abordados em tal entrevista, e o bilionário chocou a todos ao dizer, dentre outras coisas, que possui fé mas, se pudesse, eliminaria os ditos líderes religiosos e derrubaria todos os luxuosos templos sem dó nem piedade.
    Em um momento da entrevista, um dos radialistas, esperando uma resposta preconceituosa, perguntou ao magnata se eliminaria os homossexuais da face da Terra. A resposta, transcrita abaixo, surpreendeu o mundo: 
"Jamais faria uma loucura desse tipo! Um dos motivos é minha bissexualidade! E antes que invente de perguntar algo mais ousado ainda, nem mesmo eliminaria os travestis! Se por acaso eu entrasse para a política, faria a regularização e eles poderiam fazer como as prostitutas em alguns lugares do mundo.
Isso não significa, portanto, que eu defenderia homossexuais acima de tudo! Assim como no meio dito "normal", há muitas pessoas de péssimo caráter nesse meio! Pessoas de má fé! E essas seriam presas como qualquer outra pessoa."
    (...)"Se Deus odeia os homossexuais? Creio que não. Acho mais fácil Ele odiar quem usa Seu nome para enganar as pessoas fracas mentalmente e torná-las como papagaios-zumbis, que só fazem perambular por aí repetindo a mesma baboseira sempre! Essas pessoas sim merecem levar uma porrada enquanto caminham pelas avenidas ou serem enforcadas em nome da moral e bons costumes! E eu já falei demais! Adeus!"
    E um dos homens mais ricos do mundo se levantou e saiu. Ao chegar à porta da rua, avistou algo inimaginável: seus seis seguranças estavam, cada um, acorrentados a uma pessoa diferente que, por sua vez, estavam conectadas pela cabeça a construções que remetiam a templos das mais diversas religiões.
  Os olhos dessas pessoas não traziam luz e vida, apenas escuridão e, como Antoinne descobriria logo em seguida, a morte. O polêmico e incansável senhor Antoinne de Saritré foi espancado ali mesmo pelos próprios seguranças, enquanto era humilhado e achincalhado em nome do deus de cada uma daquelas pessoas. Como já era um senhor no auge de seus 79 anos, não demorou muito a morrer e, assim que a vida deixara seus olhos, as doze pessoas e os seis templos arderam em alegria. E as pessoas se tornaram maiores, enquanto suas cabeças encolhiam e suas línguas profanas cresciam cada vez mais podres. Dos templos era possível ouvir o tilintar das inúmeras moedas que entravam e do cinzento e tristonho firmamento, caia uma fina chuva salgada como as lágrimas de dor de um pai ao ver seus amados filhos usando-o como instrumento da morte.

P.S.: Os espertos acorrentaram e amordaçaram Deus com suas línguas profanas e taparam os ouvidos dos idiotas para que não ouçam sequer suas abafadas súplicas de que a humanidade se torne boa.
P.S.²: Deus, que dizem ter criado a humanidade sua imagem e semelhança, jamais permitiria que alguém fosse julgado e que sua vida fosse tirada apenas por ser diferente dos demais. Talvez esse seja seu maior teste: a aceitação do diferente.
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domingo, 21 de agosto de 2011

O Fim - Relato

Não é nada fácil lidar com a certeza da morte, não é mesmo? Saber o dia exato em que eu, você e todos no planeta vão morrer é de enlouquecer qualquer um. Anteontem, na TV, nos foi noticiado que o mundo encontraria seu fim em três dias, que é o tempo necessário para que a Nuvem do Caos, como foi apelidada, chegasse à Terra. Na hora, achei que fosse alguma piada de muito mau gosto, mas desisti de achar isso quando me toquei de que era o presidente nos dando essa chocante notícia.
Logo após o pronunciamento do excelentíssimo, as emissoras vincularam alguns programas explicando sobre essa catástrofe e, mais tarde naquele mesmo dia, uma mensagem de adeus que é transmitida em todos os canais até hoje e o mundo mergulhou no mais profundo caos. Alguns vizinhos saíram gritando na rua, outros choraram, uns até mesmo comemoraram! À noite, todos estavam na rua bebendo, brigando, transando, se matando, saqueando bares e mercados. Apenas me tranquei em casa e dormi. Fiz isso duas vezes.
Hoje é a véspera do meu fim, do seu fim e do fim de toda humanidade. Vou pegar uma garrafa de uísque do meu pai e vou realizar um sonho: beber e tocar naquele piano que está salão da minha antiga escola. Confesso que não tocarei alegres canções, pois nunca gostei delas. Só espero não estar acordada quando tudo acontecer. Seria péssimo ter que ver aquela nuvem destruindo tudo até chegar em mim. Agora, se me der licença, tenho que ir realizar meu sonho. Aconselho que faça o mesmo, pois não terá uma próxima vez.

Relato da jovem de nome desconhecido, protagonista da postagem O Fim, de Novembro de 2009.

P.S.: O fim anunciado causaria a insanidade na maioria das pessoas, atiçaria o lado cruel em tantas outras e a apatia em algumas. Como reagiríamos ao saber do nosso próprio fim?
P.S.²: A "Nuvem do Caos" é aquela disseminada por um hoax de 2006, que teria sido descoberta pela NASA e que tem a capacidade de destruir tudo o que encontra pelo caminho.
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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Frio

E o garotinho se viu perdido a beira de um bosque, em meio à nevasca com somente sua capa marrom. O frio penetrava cada vez mais em seu pequeno corpo até chegar aos ossos; era questão de tempo para que tudo chegasse ao fim e mesmo assim, havia um brilho esperançoso em seus olhos miúdos graças ao vento, além da dúvida de como puderam deixá-lo ali, daquele jeito, naquela situação, mas essa questão era prontamente respondida por sua inocente mentalidade "Eu me perdi e estão me procurando! É isso! Eles todos estão logo mais à frente, no final desse caminho próximo ao bosque!".
Tendo finalmente chegado ao final da estrada coberta de neve, a constatação: Não havia ninguém ali. Havia somente um deserto gelado, escuridão e um aperto no peito. E mais uma vez uma pontinha de esperança: "Errei o caminho! Ou eles estão atrasados... É isso! Vou esperar bem aqui para não nos desencontrarmos!".
O tempo passou e ninguém apareceu. O frio já havia tomado conta de seu pequeno corpo e o sono mortal estava chegando. Ele então se deitou e fechou os olhos; ainda conseguiu sonhar com todos chegando e levando-o a um lugar quente e aconchegante, mas a imagem logo sumiu e deu lugar à escuridão eterna. Estava tudo finalmente acabado: ali jazia um corpo frio e abandonado à própria sorte, sem, entretanto, perder a esperança.


P.S.: Quantas vezes já não me senti um pequeno garoto esperançoso em um deserto gelado? 
P.S.²: A inspiração nem sempre aparece após um desabafo tão forte quanto a postagem anterior. Mas aos poucos ela dá seus sinais de que retornará.
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quarta-feira, 8 de junho de 2011

Estranhas Metamorfoses (A Psicodelia de um Coração Partido)

Tantas mãos, tantas bocas, tantas faces, todas me agarrando, me tomando para si, me arrancando generosos pedaços, intensos suspiros, arrepios e calafrios em meio a escuridão. Não há mais roupas, nem defesas, nem pudor, sequer há alguma vontade nisso, há apenas o vazio e a sensação de incompleto.
Uma mão rasga-me o peito de dentro para fora; outra mão sai do mesmo lugar e termina de abrir a passagem! Olho para baixo: há apenas uma face risonha e ensangüentada, saída de meu tórax, que lambe os beiços para aproveitar cada gotícula de meu sangue. Agora ela se põe a gargalhar e começa a alargar a passagem para que seu corpo saia. É em vão: está preso a mim! Apenas uma pequena parte consegue se soltar, é o suficiente para que consigamos nos encarar de frente. Há um beijo. Amargo, mas há um beijo! Não há para onde correr!
Movimento inesperado: corpo partido ao meio! Uma das partes se põe a procurar outro peito para habitar, a outra continua dentro de mim, se tornando uma pequena cópia do outro corpo. Mas agora há espinhos perfurando minha carne. Outras mãos, outras faces, outras bocas, outros corpos almejando um espaço destruído apenas para roubar pedaços para remendarem o que já foi destruído por outras mãos, outras faces, outras bocas e outros corpos. Mas aquele pequeno corpo consegue evitar que levem tudo. Ele defende seu espaço, apesar de fazê-lo sangrar mais e mais; logo seus espinhos terão transpassado toda a carne.
Ajoelho-me no chão, apenas uma lágrima possui coragem o suficiente para rolar por cima dos ferimentos, fazendo o ardor tomar conta. Logo as luzes se acendem. Há concreto,  vidro, carne, luzes coloridas, faces conhecidas, dinheiro, aconchego. O tempo passa, as cicatrizes ficam, as feridas se vão, os espinhos encolhem.
E aquele meio corpo retorna, destruído, machucado, ensanguentado, mas com força suficiente para romper meu peitoral e voltar ao lar. As luzes se apagam, tudo recomeça; e há apenas um sorriso em meu rosto.


P.S.: Talvez o caminho mais feliz não seja o mais tranquilo ou o mais belo. Talvez seja aquele que temos mais medo.
P.S.²: Título inspirado na tradução do filme Xtro. Nunca o assisti, mas a tradução de seu título me soou interessante.
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quarta-feira, 18 de maio de 2011

Curta 5: A Inveja

Uma dama de meia idade, amarrada nua a uma árvore. No começo gritos e esperneios, seguidos da desistência e acomodação. Apenas o silêncio respondia ao apelo cochichado. Quando finalmente decidira recomeçar a fuga, um enorme e faminto urso devorou-lhe da cintura para baixo. A mulher, por milagre ou maldição, sobreviveu mesmo assim, mas já não podia soltar-se das amarras, pois seria alvo fácil para toda sorte de predadores. Ela passou a viver amarrada a essa árvore, observando o mundo ao seu redor e o amaldiçoando por não poder mais desfrutar de sua liberdade. E passou, também, a ter pequenos animais carnívoros a mordiscar suas feridas. Toda sua vida poderia ter sido diferente se ela tivesse se esforçado mais.



P.S.: A inveja acaba sendo o resultado da acomodação, que nos faz ficar para trás e odiarmos quem não parou por sequer um segundo.
P.S.²: A imagem que me veio à cabeça é bem melhor que essa postagem. Mas gostei do mesmo jeito.
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quarta-feira, 13 de abril de 2011

E Assim Surge um Mito

Era uma grande fazenda, ícone na produção de café no Brasil do final do século XIX. A lei áurea já havia sido assinada, mas ainda existiam os fazendeiros que mantinham alguns escravos em suas propriedades e assim era nessa fazenda e, para evitar fugas ou problemas, o proprietário fechou um acordo com os escravos: daria algum dinheiro e comida de boa qualidade em troca do silêncio. Eles não tinham nada a perder ou a ganhar, já que só se veriam teoricamente livres da escravidão e praticamente passando necessidade em um mundo cruel. 
Nessa propriedade morava uma família de escravos que há muito tempo servia ao proprietário e que, inclusive, se formou em meio ao martírio do abusivo trabalho. Era composta pelo casal e seu filho de 14 anos. O casal era simples, de poucas palavras e que gostava de trabalhar muito. Sempre tiveram a simpatia do proprietário e com isso não recebiam chibatadas ou eram humilhados; já o garoto era um pouco mais falante, mas não gostava muito de aprontar, e sim de aprender! Vivia sorrindo, trabalhava duro e no final da tarde gostava de aproveitar o tempo livre conversando com os outros escravos, perguntando sobre tudo o que via ou que os outros haviam visto durante o dia. 
Em uma tarde qualquer, o proprietário o chamou e o levou para a sala principal onde estavam outros fazendeiros importantes. Todos fumavam charuto, bebiam uísque e riam descontrolados. Ao verem o garoto, fizeram silêncio. O menino estava cheio de vergonha, nunca estivera em um lugar com tanta gente importante (e bêbada) em toda sua vida e não sabia como se comportar. Disse um singelo "oi", mas não houve resposta, apenas algumas trocas de olhares famintos entre os brutamontes, que logo se puseram em pé e partiram pra cima do garoto. Despiram-no e começaram a se despir também; ele tentou sair dali antes que algo acontecesse usando alguns movimentos de capoeira, mas foi impedido ao levar um golpe de facão na virília esquerda. A dor era tão absurda que não conseguia se mover e, mesmo ensanguentado, aguentou aquele show de horrores regado a bebida e muita zombaria por parte dos homenzarrões. 
Estava tudo acabado. Os homens puseram novamente as roupas e partiram. O proprietário pegou o pobre garoto e o levou para a mata e ali o despejou, com um enorme e profundo corte. Ele não conseguia pensar em nada, somente em se perguntar a razão de tudo aquilo, daquela violência desnecessária. Resolveu não mais voltar pra casa e seguir mata a dentro em busca de alguma solução tanto para a pergunta quanto para se curar e não morrer. Acabou encontrando o povo da mata, que o ajudou e o ensinou sobre a mata, seus benefícios e o que usar dela para cada situação. Infelizmente, sua perna não pode ser salva, pois demorara para encontrar alguém que lhe ajudasse a tempo. Após algum tempo, já conseguia andar sem ajuda, já conhecia tudo que necessitava para viver na selva e também se acostumou a pitar, já que havia um ou outro escravo fujão no meio do mato com quem fizera amizade e dividiu as primeiras tragadas, além de receber um gorro vermelho como uma lembrança por ter ajudado alguém que precisava.
Apesar de ter sofrido tanto, o agora rapaz não quis vingança. Tão pouco quis voltar àquela fazenda. Dedicou sua vida a fazer algo que deixasse os donos de fazenda irritados e os escravos a rir muito. Cada dia era uma travessura nova: amarrar crina dos cavalos, assoviar de forma aguda e alta durante a noite para que ninguém o localize e fiquem com medo, distrair cozinheiras de alguma forma para que a comida queime. O por quê disso e não de uma vingança? Aquele garoto nunca teve maldade no coração, não aquela maldade perversa que as pessoas se acostumaram, mas sim uma maldade infantil e engraçada, de alguém que não teve a inocência abalada nem mesmo pelo pior dos atos.


P.S.: Uma estranha história que, em um momento, se torna familiar demais.
P.S.²: Apenas uma releitura do folclore nacional. Apenas quis imaginar a origem desse ser de uma maneira controversa.
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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Uma Noite Qualquer

Após um dia de muitas brincadeiras (boas ou nem tanto), lá estava César em sua cama, dormindo. Era um dos únicos momentos na qual era possível vê-lo tão sereno: à noite, na hora de dormir. Seus olhos fechados, respiração profunda, imaginação funcionando aleatoriamente e pegando momentos já vividos, pessoas já vistas e misturando tudo em histórias das mais diversas. Fora do horário de dormir, o garoto não era tão sereno. Ele já fez muitas pequenas maldades. A maioria deixava todos indignados, como na vez em que colocou uma bombinha de considerável potência dentro de um filhote de gato e assistiu rindo o momento da explosão.
Sua mãe, que fora criada em meio a cinco irmãos arteiros, achava aquilo até certo ponto normal, afinal, já aprontara das suas também e achava que aquilo tudo era apenas uma fase. Já seu pai, apesar de ter sido um pouco arruaceiro quando adolescente, achava aquelas atitudes muito malévolas para uma criança tão nova - César possui apenas 8 anos - e, para tentar fazê-lo parar de ser cruel, já fez de tudo: desde conversas amistosas até uns belos tapas. Nada deu certo. Resolveu tentar algo mais infantil e contou a história do homem do saco; o filho só fez rir e ficou ainda pior. Quem poderia imaginar que um garoto que dormia tão sereno fosse tão cruel?
César, apesar das encrencas em que se metia, gostava de ter seu quarto sempre arrumado e passava a maior parte do tempo livre nele. Era um quarto aconchegante com uma enorme janela por onde entrava razoável quantidade de luz solar e ficava completamente iluminado pelo luar que banhava sua cama. Luar esse que o fazia dormir como um anjo. E era assim que ele estava no momento.
Enquanto dormia, seu quarto era tomado por uma suave neblina enegrecida que foi se juntando ao redor da cama e, após algum tempo, tomou forma de uma criatura magra e encapuzada que se posicionou ao pé da cama. Tal criatura mais parecia uma sombra encapuzada, lembrava as descrições que as pessoas faziam da morte, mas não possuía um esqueleto por baixo dos trapos que formavam sua capa, apenas uma figura tão obscura quanto uma sombra. E esse estranho ser arrastava consigo algo que se assemelhava a um enorme e pesado saco feito de trapos negros e esvoaçantes que não hesitava em se mexer ferozmente, como se algo quisesse escapar dali.
A criatura ficou imóvel ao pé da cama por alguns momentos, como se estivesse analisando o garoto por algum motivo, mas logo arrastou o saco para mais perto da cama e, de imediato, alguns pedaços do trapo começaram a tomar forma de pequenas mãos negras e se esticaram em direção a César. As mãos passaram por suas pernas e logo entraram pela bermuda do garoto que, ao sentir a estranha sensação de estar sendo invadido, olhou para trás, se assustou com a criatura e tentou gritar e se arrastar para fora da cama. Tarde demais! As pequenas mãos começaram a sair por sua boca e a fazer o caminho de volta para perto da aparição, envolvendo todo o garoto em trapos negros que se moviam em desespero.
O estranho ser então puxou o saco de volta para próximo de si, levantou-o e jogou-o para trás afim de poder arrastá-lo e finalmente ir embora. E assim o fez. Foi-se dirigindo à janela e voltou a forma de neblina para rapidamente desaparecer levando mais um garoto de coração negro. A lenda da qual desdenhou veio ensiná-lo uma lição. Mas somente César a aprendeu, os outros jamais saberão.


P.S.: Lendas antigas e esquecidas retornam em uma noite qualquer para seu devido lugar no imaginário doentio das pessoas.
P.S.²: Um tanto quanto clichê, mas gostei muito de imaginar essa cena!
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quinta-feira, 31 de março de 2011

Curta 4: A Tristeza

Roupas acinzentadas, olhos inchados, cabelos desgrenhados. Sua face pálida e sem expressão a observar o nada pela janela. Uma lágrima escorrega gentilmente por seu rosto. Suas mãos sempre unidas e próximas ao coração, como se estivesse sempre em uma prece esperançosa por alívio de alguma dor sufocante.  És bela mesmo assim! Muitos a repudiam, a dopam, a maltratam, tentam se livrar dela dos mais variados métodos. Tudo em vão! Ela sempre volta. Quando menos se espera, ela está a olhar pela janela novamente; às vezes sem saber o por quê. E, para quem sabe como lidar com tamanha responsabilidade, deixa após ir embora a sobriedade, o conhecimento, a força necessários para lidar com todas as dificuldades impostas por suas irmãs (tão cruéis aos fracos quanto ela). E mais uma lágrima gentilmente escorrega por seu rosto.


P.S.: Tão bela, tão selvagem, tão sedutora! E, ao mesmo tempo, tão cruel. Não é à toa que estou apaixonado por ela!
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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Conhaque, Lágrimas e Paisagens

E lá estava o velho poeta sentado à sua escrivaninha, em frente à janela, fumando uma de suas cigarrilhas e vendo o sol encostar no mar de maneira majestosa. Essa era sua rotina já há muitos anos: sentar e ver os dias passarem; anotar alguns pensamentos sem pretensão alguma, já que ninguém irá ler, e lembrar dos momentos mais incríveis e felizes de sua vida ao lado do seu grande amor. E chorar. Deixar com que as dolorosas lágrimas escorreguem gentilmente por sua face enrugada.
Após um longo momento imóvel, o ancião busca um copo de conhaque e volta a se sentar para admirar aquele incrível retrato, que outrora era admirado a dois e tinha um ar de recompensa após tanta luta para que ficassem juntos. Agora só representava a solidão, a insignificância perante o mundo que não para por mais que seus filhos sofram. E mais uma vez as fumegantes lágrimas marcavam aquele rosto que antes já fora alegre. E agora o ardor do conhaque se juntava ao amargo do nó em sua garganta.
Desde que se viu só no mundo, aquele senhor apenas queria alguém para conversar. Mas era impossível, pois ele e sua outra metade se mudaram para um lugar isolado a fim de não ter ninguém interferindo novamente em algo tão bonito quanto aquela união. Eles só se esqueceram que a unica certeza que paira neste mundo era implacável e nunca deixaria que tudo terminasse bem! E ela deixou isso bem claro anos atrás. Desde então, o idoso só pensou em ir ao encontro daquela pessoa que deu significado à sua vida e desde então lembrou que atos desse tipo só fariam com que ele fosse para um lugar completamente diferente daquele onde essa pessoa está nesse momento! Mesmo ele tendo sido um grande cético, tem esperança verdadeira em reencontrar aquela pessoa que um dia o completou. Seus desejos estavam para ser atendidos.
Em uma fresca noite de primavera, enquanto observava as estrelas e imaginava a qual delas se juntaria quando chegasse o momento, caiu no sono. E sonhou novamente com seu amor verdadeiro! Dessa vez seu rosto e voz eram perfeitos! Tantos anos sem ver ou ouvir a sua metade involuntariamente haviam apagado tais lembranças de sua mente. Foi aí que percebeu que não estava sonhando. Sua triste rotina e sua perseverança em não cometer o ato de desespero foram recompensados finalmente, eternamente.

P.S.: Sempre haverá algo de bom advindo de algo ruim. É o ciclo a que todos nós estamos fadados a cumprir querendo ou não.
P.S.²: Talvez o mais difícil de todos.
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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Composto Cardíaco - Amarras

O que pode acontecer para que o composto vaze? Em que quantidade ele poderá sair? Ele realmente pode ser controlado? Ou ele controlará o corpo inteiro da pessoa? As amarras, depois de completamente abertas, terão algum outro propósito?
Mais perguntas de respostas até então desconhecidas... o composto, na maioria dos casos, vaza em quantidades pequenas, fazendo com que uma pessoa sofra por alguns "instantes" e, dependendo do preparo da pessoa e da concentração, faz com que ela cometa o ato mais covarde de todos para se livrar de tudo isso.
Mas, se o composto for se concentrando pacientemente por um longo período sem esperanças, ficará cada vez mais sem espaço e forçará as amarras até o limite. Até que, por algum motivo que lhe tire a última gota de esperança, fará com que elas se arrebentem e se espalhará por todo o corpo, tomando controle da alma e tornando-a negra e sugestiva a influências ditas negativas.
O controle obtido não é total, por mais concentrado que essa mistura de mágoa, dor e escuridão seja. A alma ainda sim lutará para não sucumbir, mas estará fraca demais para voltar ao que era sozinha. Ela precisará de muita ajuda externa e, mesmo assim, nunca mais será a mesma e deixará de ter os traços infantis e alegres que sempre teve.
 Essa alma, abatida e perdida na escuridão, buscará por alguma outra no mesmo estado para poderem sucumbir juntas. Mas não é o que acontece. As amarras abertas de ambos os "corações" acabarão por se juntar e prender os compostos em um único recipiente, que não é mais forte ou mais fraco que o anterior, mas que terá a capacidade de aguentar mais pressão, afinal, as amarras que são "remendadas", nesse caso, acabam por se tornar mais fortes.
E o composto poderá vazar mesmo assim desse novo recipiente, tentando controlar ambas as almas, mas será um trabalho árduo para cumprir esse objetivo. As amarras remendadas tem não só a ajuda umas das outras, mas de duas almas que amadureceram juntas e que podem, finalmente, usufruir dos estranhos benefícios de algo tão obscuro e tão temido.


P.S.: Tudo que o composto pode trazer de benefícios e efeitos colaterais ainda é um mistério. Ele se adapta a cada situação, tornando-se algo temporariamente incontrolável.
P.S.²:  Dois corpos, um recipiente, uma quantidade maior de composto. Assim que ele vaza, as duas almas compartilham da dor. E cabe a ambas superarem juntas e manterem as amarras cada vez mais fortes.
P.S.³: Alguma dúvida ou sugestão? Clique aqui e saiba mais.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Curta 3: O Animal

Um enorme rinoceronte negro corre livremente pela savana. Em seus olhos vermelhos o vazio, o instinto. Em sua fuça, dois enormes, negros e pontiagudos chifres, usados apenas para amedrontar possíveis predadores. Em sua mente, apenas a vontade de correr, pisotear, grunhir mais alto do que todos os outros animais da selva. Em sua vida, apenas o esquecimento, a confusão, a raiva, a tristeza de não ter a capacidade de pensar.
A corrida logo lhe cansa. Ele necessita comer e beber para sobreviver. Seus olhos fitam o horizonte e ele logo encontra um enorme açude rodeado pelas mais belas e suculentas plantas. Finalmente lhe é concedido o dom de  conhecer seu objetivo. Há muitos obstáculos, mas ele passará por cima de todos, não importando qual seu grau de dificuldade! Ele conseguirá? Talvez... Se não conseguir, voltará a correr novamente até que nada mais lhe reste a não ser descansar em paz.



P.S.: Quando a um animal é concedido o dom de estabelecer uma meta, tenha certeza que ele a cumprirá independente do preço a pagar.
P.S.²: Começo de ano com um texto não tão agradável de se ler, mas que possui um significado interessante ao seu autor.
P.S.³: Dúvidas ou sugestões? Clique aqui e saiba mais!!